Estudo da Unicamp identifica 14 agrotóxicos na chuva, dois deles de uso proibido no Brasil
02/06/2025
(Foto: Reprodução) Trabalho analisou amostras de chuva de Campinas, São Paulo e Brotas, e resultado foi publicado em revista científica. Uso de agrotóxicos é alvo de fiscalização mais rígida no estado de São Paulo
A preocupação com o uso de agrotóxicos foi a base de um estudo da Unicamp que identificou a presença de substâncias químicas até mesmo na chuva - entre elas, de dois produtos proibidos no Brasil. A pesquisa foi publicada na revista científica Chemosphere.
A pesquisa revelou que os agrotóxicos aplicados nas lavouras também se dissipam na atmosfera. Vento, temperatura e umidade influenciam nessa distribuição e as substâncias ficam condensadas em gotas de chuva, retornando ao solo e aos reservatórios de água.
Os pesquisadores analisaram a água da chuva de três cidades: Campinas (SP), Brotas (SP) e São Paulo (SP). O resultado de dois anos de coleta e análise e mostrou a presença de 14 tipos de agrotóxicos. Destes, dois são proibidos no Brasil: o fungicida carbendazin e o inseticida carbofurano.
"Eles foram proibidos por alguns estudos em que foram associados, principalmente, ao impacto deles no sistema reprodutivo, e também ligados ao potencial cancerígeno, tanto em seres humanos quanto em organismos aquáticos", explica Mariana Amaral Dias, pesquisadora do Laboratório de Química Ambiental da Unicamp.
Além disso, entre os agrotóxicos encontrados, dez são proibidos na União Europeia, mas liberados por no país. E quatro não têm definição no Ministério da Saúde de qual seria a concentração segura na água, segundo a pesquisa.
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"O Brasil tem liberado para uso, nas diferentes culturas, mais de 400 agrotóxicos. No entanto, a nossa legislação, seja para a qualidade de água de rio ou água potável, ela considera cerca de 10% desses compostos. Os outros 90% não são legislados no Brasil, mas não significa que eles não causam efeitos. Isso traz uma falta de informação para nós ao entender quais são os reais impactos do uso desses agrotóxicos pós aplicação", destaca Cassina Montagner, pesquisadora da Unicamp.
Consequências
Mariana Amaral ressalta que os efeitos da presença dos defensivos nocivos à saúde são cumulativos, e não vão trazer consequências imediatas.
"Não quer dizer que se a gente for tomar, por exemplo, um copo de água da chuva, a gente vai ter algum efeito. Isso pode acontecer se a gente fizer essa exposição ao longo de muitos anos", explica.
"A gente tem que acender um alerta à população de que a água da chuva não é tão limpa quanto a gente pensa", completa Mariana Amaral.
No campo 🍅
Em uma lavoura de tomates em Sumaré (SP), o produtor rural Adalberto Freitas alterna 12 tipos de inseticidas e outros 10 contra fungos e bactérias. Cada passagem e dosagem fica anotado à mão no caderno de campo e registrado nas notas fiscais.
Os defensivos são usados para o controle das pragas do tomate, uma das culturas que mais necessitam de agrotóxicos.
"Esse ano, a gente teve muita incidência do mosca-branca, acro, virose. Então, a gente tem que usar. Se a gente não usar, não colhe. Em vez de vocês [os consumidores] pagarem R$ 10 ou R$ 12 na banca, vão pagar R$ 50 no [quilo do] tomate na banca", explica.
Indispensável no campo e nocivo para saúde, Unicamp identifica presença de agrotóxicos de uso proibido na chuva
Reprodução/EPTV
Adalberto afirma que segue à risca cada recomendação de uso da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), descrita nos produtos. "A dosagem, reentrada, carência para consumo. Está tudo aqui na bula. Tem que seguir sua risca", diz.
O produtor vende tomate para vários estados, que exigem certificação e rastreabilidade dos agrotóxicos utilizados. Para provar que a lavoura está saudável e não há risco para a saúde, o próprio produtor tira o fruto do pé e experimenta horas após o manejo do agrotóxico.
"Tem que vender produto que o cliente vai consumir, né?", reitera o produtor.
Fiscalização e regularização
A legislação paulista sobre o uso de agrotóxicos entrou em vigor em março de 2024. Antes disso, o produtor rural recebia, no máximo, uma advertência. Agora, as irregularidades com o uso de pesticidas são punidas com processo administrativo e multa a partir de R$ 5 mil.
Em todo o estado, 57 foram aplicadas em pouco mais de um ano.
A fiscalização é feita pela Coordenadoria Estadual de Defesa Agropecuária (CDA), que vai a campo escolhendo propriedades aleatórias para avaliar se os procedimentos no uso de agrotóxicos estão de acordo com a fiscalização.
Todos os agrotóxicos para utilização e uso agrícola têm que ser registrados junto ao Ministério da Agricultura e Pecuária. Tem uma lista de produtos comerciais que podem ser utilizados. A nossa autuação é com base nisso, seja no armazenamento irregular, na compra de um agrotóxico de forma irregular, sem a apresentação de uma receita agronômica, na utilização de acordo com o que está recomendado para utilizar esse produto.
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Reprodução/EPTV
O que dizem a Defesa Agropecuária e o Ministério da Saúde?
Sobre os produtos proibidos encontrados nas análises da Unicamp, a explicação da Coordenadoria de Defesa Agropecuária foi que "eles compõem defensivos agrícolas autorizados e aparecem quando se degradam na natureza".
O Ministério da Saúde disse que a identificação dessas substâncias "reforça a necessidade de vigilância constante e práticas agrícolas mais seguras, por exemplo, restrição à pulverização aérea".
Sobre as quatro substâncias que não têm legislação a respeito da quantidade aceitável na água, a Coordenadoria disse que estão presentes em mais de 200 produtos registrados no Brasil.
O Ministério da Saúde justificou que estados e municípios podem, "de forma proativa, monitorar substâncias com potencial de contaminação local, mesmo que não estejam previstas no padrão nacional".
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